domingo, 26 de setembro de 2010

"Mete medo, entrevistá-lo"



Foi assim que Mário Crespo se dirigiu a António Lobo Antunes na sua primeira entrevista a este escritor de excelência, em 2007.

Não sou nem nunca fui propriamente um ávido leitor. Por vezes sinto-me como se fosse um realizador de cinema que poucos ou nenhuns filmes viu. Meio parvo bem sei; talvez até estúpido!

O mesmo acontece com a obra de António Lobo Antunes - para alguns, o justo vencedor do Prémio Nobel em detrimento de Saramago; não discuto isso -: não a li, confesso.

Em tempos idos, tentei iniciar-me no Memória de Elefante de 1979. Depois, sem nenhuma explicação propriamente plausível, não li nem um terço.

Porém, a sua escrita complexa fascina-me. Requintada, por vezes obscura, mas de uma qualidade tremenda, é assim que definiria a escrita de Lobo Antunes.

Mas, escrita à parte, o que me fascina realmente é Lobo Antunes como homem. Como homem não direi, mas como aquela pessoa que responde nas várias entrevistas que lhe são feitas (quando está para aí virado, pois é-lhe conhecida a vertente recatada em relação a estas matérias, que não condeno, aliás). Só o conheço nesse campo muito específico, claro.

Se a sua escrita é complexa, pois o homem ainda é mais. Acho fascinante ouvi-lo tal é o nível superior intelectual em que ele se encontra, a meu ver.

Numa época onde em matéria de comunicação o que prevalece é o tradicional KISS (Keep It Simple and Stupid), António Lobo Antunes consegue ter, em mim, um efeito de completa atenção: com os dois olhinhos bem abertos e com os dois ouvidos amplamente sintonizados. É preciso ouvi-lo com muita atenção, pois nada é despiciendo.

De um ponto de vista social, penso que Lobo Antunes é facilmente incompreendido - daí o seu natural alheamento social que lhe é apontado.

Mas é curioso como Crespo aborda o escritor e médico Lobo Antunes. Baixou ao nível máximo. Mais baixo não dava. E com isso, ganhou o entrevistado. Para sempre, diria.

Crespo pode ter muitos defeitos - até como comunicador - mas um não teve: não subestimou Lobo Antunes. De todo. É fácil, direi, cair nessa tentação.

Bravo Crespo.

Bravo Lobo Antunes, a meu ver, um ser com um nível intelectual acima da média.

Lamento concluir.

terça-feira, 21 de setembro de 2010

And now, the billion dollar question!




Porque é que este homem não é o melhor jogador de futebol do mundo?

Porque passa a vida nisto, claro está.

Ding, ding, ding: Bingo! You won!

Esta é dedicada ao M.

sábado, 18 de setembro de 2010

Ueshiba sensei



[Foto roubada do Aikido Journal]



Morihei Ueshiba foi o fundador do Aikido. Por isso, e por ter sido a pessoa que deu à luz este estilo de vida, cerca de um milhão e meio de pessoas em todo o mundo no início e no fim das suas aulas homenageiam O'Sensei - como é carinhosamente chamado pelos praticantes, significando grande mestre ou grande professor. Uma forma de agradecimento, esta homenagem.

A razão, creio eu, é somente essa. O cerimonial, a saudação ou a vénia do começo e fim do treino, representa isso. Se representar algo mais para alguém, não sei. Mas O'Sensei não é nenhuma divindade. Foi um homem, como tantos outros. Um homem com uma grande visão e com grande carisma segundo parece. E isso, claro, é raro. Será por isso recordado, seguramente, por muitos mais e bons anos. Condecorado pelo governo japonês em 1960, por exemplo, Morihei Ueshiba é um nome que ficará nos anais da história. Mas sobre O'Sensei muita literatura online e sem ser online é possível encontrar, pelo que não irei muito a fundo nesta matéria, até porque não estaria à altura para o fazer - nem é meu objectivo.

O que me traz aqui a este post são outras reflexões.

Nas minhas aulas é raro invocar as memórias de O'Sensei. Sinto-me desconfortável em fazê-lo. Porquê? Primeiro porque é uma figura de outra galáxia, de outro universo, de outra cultura, de outros tempos, de outras vivências, ou seja, uma figura que, ao nos referirmos a ela, o que quer que dali saia será sempre algo com um toque de esoterismo. E isso, não é o meu estilo, como racionalista que sou. Segundo, porque é muito difícil falar de O'Sensei e em que consistia o seu Aikido. O seu Aikido nunca foi tão palpável como é hoje o do seu neto ou como foi o do seu filho. Mudava a seu bel-prazer e, mais importante, mudou e muito ao longo da sua vida, desde os tempos em que era um puto novo com trinta e poucos anos até ser um puto velho com setenta e tal anos. O seu Aikido sofreu transformações evidentes. Falo de evolução, claro. Evoluiu! E ainda bem que assim foi.

Existe aquela história em que um fotógrafo (ou qualquer coisa parecida, mas fotógrafo, para a história, encaixa melhor no que se pretende contar - cá está o que falava... a constante falta de palpabilidade da coisa) foi ao dojo de O'Sensei vê-lo a executar algumas técnicas. Ueshiba executa umas atrás das outras enquanto o fotógrafo vai tirando fotos. De repente, o fotógrafo interpela O'Sensei pedindo-lhe que repetisse a mesma técnica outra vez, para efeitos de fotografia. O'Sensei executa novamente a técnica, mas já fez uma outra, diferente. O fotógrafo questiona-se, «eu tinha-lhe pedido para repetir, executou outra diferente», ao que Ueshiba retorquiu «claro, ele atacou de outra forma!».

Demonstrativo de como o Aikido de O'Sensei era o mais puro possível. Emanava Aikido por tudo quanto era sítio. Isso era O'Sensei. Isso. Aikido em forma humana. Felizmente tive a honra de aprender com outros professores que se aproximam desta natureza de Aikido em forma humana. São poucos, mas alguns alcançam esse estado e alguns são ainda vivos. Outros, infelizmente, já lá vão.

Ora, é por sermos todos uns comuns terrenos, eu mais os meus caríssimos alunos, que me é difícil invocar o sensei Ueshiba. Mas já o seu neto, Moriteru Ueshiba, actual doshu, é alguém que invoco com muito mais facilidade. Já para não falar, em cascata, que me é mais fácil referir senseis mais abaixo no chain of command, e mais fácil fica quanto mais abaixo for.

Porque falar de divindades, coisas lá longe, por vezes obscuras e que não compreendemos de uma forma total (eu não, pelo menos), prefiro abster-me de entrar por esses caminhos.

Prefiro fazer referências a algo com que tive contacto efectivo. Isto é, gosto de tentar transformar um treino de Aikido no mais palpável possível, no menos esotérico possível (mas não descarto a vertente filosófica ou mesmo a espiritual), e no mais rigoroso possível em termos de respeito intelectual connosco próprios.

Porque enveredar por uma situação de conclusões estilo conversa de café considero um desrespeito para com o Aikido.

Quando não se sabe do que se fala, não se deve falar.

Não sei muito de O'Sensei, logo, falo pouco dele. Nunca o senti, nunca o toquei, nunca o vi, nunca o ouvi, nunca ele me tocou, nunca falámos. Não o conheço.

Do mesmo não posso dizer de outros grandes mestres. É nestes em que me apoio. É nestes que consigo passar a mensagem mais sincera e mais genuína aos meus alunos.

O'Sensei que me perdoe, mas é o meu sentimento e funcionamento. Perdoar-me-á com certeza, quanto mais não seja naqueles poucos segundos em que olho para a figura dele no cerimonial de início e fim de treino em que agradeço sinceramente o facto de ter dado à luz um estilo de vida que acontece ser o meu. Agradecimento e sentimento este que guardo para mim e não partilho com mais ninguém.

Bom, acaba de ser partilhado num blogue público. Mas não faz mal. É diferente.

;)

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Preparando terreno




Na Cimeira do Partido Popular Europeu (PPE), em Bruxelas, na passada quarta-feira.

sábado, 11 de setembro de 2010

Dedicada ao J.

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Uma questão de olfacto, certamente



Há coisas que não me cheiram bem. Como esta que uma vez referi.

Uma outra é esta: amigo do amigo. Cá está, também não me cheira nada bem.

Quer dizer, quando dizem católico não praticante, eu sei o que querem dizer.

Quando dizem amigo do amigo, eu também sei o que querem dizer.

Mas que não me cheira nada bem, não cheira. Desculpem lá, pronto!

segunda-feira, 6 de setembro de 2010

O Hitler



Tenho andado a ler esta obra nos últimos tempos. Devagarinho. Um trabalho extraordinário de Ian Kershaw, com quase 900 páginas (e com letras piquininas).

Vou fazer uma série de posts sobre este tema na tentativa de reunir a informação mais relevante mas de uma forma quase avulsa e sem preocupação de qualquer rigor. Para isso, leia-se o livro: é melhor.

Servirá para o interesse generalizado e, já agora, para me lembrar dos pontos mais importantes ou interessantes.

Obra esta que vem no seguimento de dois ou três volumes de Kershaw, que, pasme-se, condensou-os nas ditas quase 900 páginas, retirando dos volumes originais algumas referências a outras obras e outros, segundo percebi e segundo o autor explica no início deste Hitler. Ou seja, esta obra quase que é uma compilação. Extraordinário.

Vamos começar:


- Alois Hitler e Klara Hitler eram os pais de Adolf. Ao todo, tiveram seis filhos. Adolf era um deles. A maioria deles morreu, ou por doença ou porque... sim. Só um ou dois sobreviveu a par de Hitler, e se me recordo bem, um deles sobreviveu ainda depois da pressuposta morte de Hitler.

- A família de Hitler não era pobre. Também não eram os maiores ricalhaços de Linz, a terriola austríaca onde viviam e onde Hitler nasceu. Mas viviam bem, por via de Alois ter subido a pulso na vida. Era um zé-ninguém, mas com esforço chegou a um posto considerável na função pública (a fazer o quê, desconheço). Nesse sentido, Alois queria um caminho semelhante para Hitler. A verdade é que este não gostava nada dos estudos. Era desagarrado e estava-se marimbando para os estudos. Não tinha grandes objectivos. Fica a ideia de que se Hitler tem nascido no século XXI, seria certamente agarrado ao PC dia e noite, basicamente. O objectivo de vida de Hitler, ou de carreira, era a arte, tão-somente. Indolência era a palavra de ordem para Hitler. E assim foi até por volta dos seus trinta anos de idade, quando começa a discursar nas cervejarias de Munique. Mas adiante.

- Hitler era algo distante e alheado. Consta que Klara, sua mãe, terá sido a única mulher que verdadeiramente amou em vida. O seu pai, Alois, de vez em quando dava-lhe umas galhetas, mas nada do outro mundo... Podemos afirmar, por isso, que Hitler até teve uma infância normal, com tudo o que à época poder-lhe-ia ser oferecido.

- Ali na adolescência, e enquanto Klara vai tratando dos seus filhos a quinar (à excepção, como tinha dito, de um ou dois, e Adolf também), Hitler mais o seu único amigo Kubizek (amigo da escola, e sempre submisso a Hitler. Hitler falava, e o amigo, consentia e calava. Hitler era claramente o líder deste dueto) lá se piraram para Viena. A capital. Linz, como é óbvio, não lhe enchia as medidas - compreende-se. Em Viena, a situação não é a melhor. Existe bastante pobreza (estamos agora por volta do ano de 1910), as ruas são porcas e enfim, não é a capital mais agradável do mundo. Mas é aqui, em Viena, que Hitler começa a ir à ópera e a ler muitos jornais e revistas. Lê muito, de facto. Isto tudo com o income de sua mãe. Não era muito. Mas ia dando para alugar uma casa em Viena mais o seu amigo Kubizek. Mas ao cabo de dois anos o dinheiro iria terminar. Voltando às leituras, à época, existiam ilustrações e revistas de cariz anti-semita. Contudo, não lhe é conhecido, ainda, qualquer faceta ou referências anti-semitas (se não me engano, este seu amigo Kubizek é ainda vivo após 1945, pelo que pôde ser entrevistado para o efeito, etc.) O pai de Hitler, Alois, entretanto morre.

- Quando o pingo de Hitler termina, e já depois de afastado de Kubizek, Hitler entra na vagabundagem. Não tem dinheiro, não tem formação académica, nada. Nada de nada. Hitler foi para Viena também com o intuito de poder entrar no Conservatório. Mas como os seus desenhos eram ranhosos, não entrou. Nem à primeira, nem à segunda, no ano seguinte. Ainda por cima, o amigo submisso, Kubizek, se não me engano, entrou! Coitado do Adolf. Mas dizia: vagabundo. É isso mesmo, Hitler chegou a ser um vagabundo, com a barba por fazer, com roupas horrendas e mal cheiroso. Já não me recordo durante quanto tempo andou Hitler a vadiar mas possivelmente um ano, dois anos ou mesmo três anos. Só indo ver ao livro agora. Mas não é importante. O importante é que aquando destas lides, um dos amigos de Hitler da vida de vagabundo começa a abrir uma espécie de negócio. Vender uns postais e tal, ilustrados. Hitler desenha-os (copiando de quadros ou assim) e o outro sócio vendia. Começam a fazer uns cobres aí. (Mais um tipo que mais tarde serve como referência para contar e melhor explicar a vida de Hitler). Mas até neste negócio Hitler era preguiçoso, trabalhando só o suficiente para sobreviver. No entretanto, não prescinde da leitura de jornais e revistas, material indispensável para si. Material anti-semita, à época, recordo, não era propriamente raro. Vendiam-se nas bancas...

- Há pouco dizia eu que andávamos por volta de 1910. Pois agora andamos por volta de 1914 e a verdade é que estala a Primeira Grande Guerra. Já não sei bem mas Hitler voluntaria-se, ou uma coisa assim qualquer. Sinceramente já não sei. O que sei é que Hitler até combate nessa guerra, ao serviço da Alemanha. Combateu pouco mas até esteve uma ou outra vez na linha da frente, mas nada de especial. O grosso da guerra Hitler andou a fazer trabalho menor, andando de bicicleta a distribuir mensagens para a frente de combate e coisas assim. Mas até foi distinguido por esta acção. Para aí com uma Cruz de Ferro ou assim. Hitler pega aliás nalgum material da Primeira Guerra (como a Cruz de Ferro) e usa-a depois como símbolo dos militares nazis (se não me engano, claro). Hitler ter-se tornado militar foi muito bom para ele. Deu-lhe algum objectivo na vida, ainda que não deixasse de ser um frete para ele, e, mais importante, passou a ter algum income: recorde-se que não passava de um vagabundo. A guerra termina em 1918. Hitler fica no exército mais um ano ou dois. E para ele, quanto mais tempo melhor: recebia pingo. Se ele sai do exército ia fazer o quê? Estudos zero, habilitações zero.

- Uns anitos depois, possivelmente de 1920 em diante (e Hitler aqui tem já trinta e picos) Hitler começa a fazer uns discursos. Estamos em Munique. Hitler não mais queria sair de lá - era em muito superior a Viena. Hitler entra num partido recém-formado: o NSDAP. O Nationalsozialistische Deutsche Arbeiterpartei, Partido Nacional-Socialista dos Trabalhadores Alemães. Anton Drexler é um nome aqui importante. Um dos fundadores do partido nacional-socialista se não estou assim muito afastado da realidade. Nesta altura, no pós-guerra (e mesmo antes) o Movimento Völkisch era super comum. Movimento popular que apelava à nação, à raça, e por aí adiante. Ou seja, de 1920 em diante, fica a ideia de que com ou sem Hitler, o ambiente era de facto pesado (Alemanha tinha uma dívida astronómica a pagar aos países vencedores) sendo o pão nosso de cada dia haver incitamentos anti-semitas. Tão comum à época como hoje é comum... andar no facebook; quase, segundo percebi. Hitler começa a fazer os seus primeiros discursos, em cervejarias de Munique, e começa a ter cada vez mais público, cada vez mais aplausos, e cada vez o Partido tem mais militantes. Por isso, muito deve o Partido, ao início, a acção de Hitler. Recorrendo sempre (e agora sim, pelas primeiras vezes se lhe reconhece o anti-semitismo, o que é engraçado, dado que quando era vagabundo lidava recorrentemente com judeus, sendo inclusive o seu parceiro de negócio judeu. Nessa altura, não lhe é conhecida nenhuma referência negativa aos judeus. Nenhuma abonatória, mas também nenhuma propriamente negativa) a um palavreado exacerbado, apelo à raça, e apelo às questões delicadas que a Alemanha ultrapassava. Depois vem a inflação, os preços sobem como o caraças, e a pobreza na Alemanha começa a ser cada vez mais uma realidade. Basicamente, os discursos de Hitler baseavam-se no alimentar da cólera e dos ressentimentos que o povo alemão tinha. Hitler dava lenha e mais lenha, e a malta ia queimando essa lenha. Alvíssaras para Hitler, que, usando sempre a mesma fórmula, foi cativando a malta. Pela primeira vez Hitler descobre a sua vocação e algo em que é mesmo bom: discursar. Inclusive foi-lhe proposto a liderança do Partido, ao que este numa primeira fase recusou por isso significar ter que tomar outras diligências que não o discursar puro e duro.

- Hitler está mais ou menos com trinta anos de idade e ainda não cheguei à década de 30. Vou mais ou menos aqui.

Voltarei a este assunto novamente. Até lá.

domingo, 5 de setembro de 2010

O rei Bob

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Os homens da minha vida



Acontece que sou heterossexual. Tudo bem, é indiferente. Mas normalmente este tipo de pessoas não beijam homens, caso falemos de heterossexuais do sexo masculino, claro. Ou, pelo menos, causa-lhes espécie dizer que «sou capaz de beijar um homem» ou que «beijo um homem sem qualquer problema». Grosso modo, penso eu.

Não sei se fujo à regra ou não. Mas há pelo menos três homens que beijo constantemente e que tenho o maior orgulho em fazê-lo e afirmá-lo.

São eles os meus dois irmãos e o meu já ido avô, um grande sportinguista. «Cheguei a jogar à bola com o Travassos, lá no Campo Grande, ao pé do estádio de Alvalade», contava-me ele cheio de orgulho quando recordava um dos cinco violinos.

Beijar estes três homens é para mim (ou foi, no caso do meu avô) uma fonte inesgotável de vitalidade.