quinta-feira, 5 de maio de 2011

Jerónimo nota mais, Passos Coelho nota menos



Tenho um amigo que me dizia, em bom português, quando a sua profissão o obrigou a fazer Lisboa-Madrid e vice-versa semanalmente, que «andar de avião é como cagar: não gosto muito, mas tem de ser...».

É um pouco assim que sinto Passos Coelho quando vai a programas de humor. Já assim tinha acontecido no Esmiúça os Sufrágios, dos Gato Fedorento, e agora novamente no 5 para a meia-noite.

Não gosta muito, mas lá tem de ser.

Esta semana, de segunda a sexta, os cinco candidatos às Legislativas vão a este programa na RTP 2. Três já foram, faltam Sócrates e Portas.

Jerónimo: excelente. Deve ser provavelmente das poucas vezes onde a sua presença em TV sobressai, ganha pontos e cria empatia com o espectador. A apresentadora também ajudou com uma excelente preparação e condução do programa (Nilton esteve péssimo esta quarta).

O facto de Jerónimo de Sousa se apresentar no programa como se num café estivesse, à conversa com a apresentadora, é mais do que o suficiente para que o grande objectivo desta presença na TV seja alcançado: ganhar popularidade e empatia junto de quem o vê. Se ganhar um voto, melhor ainda. Brilhou.

Louçã é o costume. Não dá parte fraca; jamais. Não consegue (nem quer) nunca despir o fato de político, puro e duro, não obstante soltar as suas gargalhadas (forçadas, parece) e ser muito bom a ir na conversa e no guião do programa. Ou seja, não borra a pintura, mas também nunca é aproveitado o facto de estar num programa de humor para mostrar outras facetas porventura mais terrenas. Já no programa dos Gato Fedorento foi a mesma coisa, sendo que aí a sua contenção foi ainda mais evidente ao não ter entrado em nenhuma piada e declamando sempre a sua cassete política. Desta vez foi bastante mais positivo, entrando poucas vezes na lenga-lenga política, mas assim que a oportunidade surgia, claro que aproveitava. É melhor que Passos Coelho, pois não abusa. Sabe manter o equilíbrio.

Quanto ao programa do Nilton, com Passos Coelho, foi o mais trapalhão. O programa, o Nilton e Passos Coelho. A começar no stand-up inicial desastrado, passando pelos sketches de qualidade duvidosa e a acabar na má (ou pouco boa...) prestação de Coelho.

Coelho tenta muitas vezes dar o mote e tomar iniciativa nas piadas. Isso pode dar alguns dissabores... e deu, a meu ver. Nomeadamente quando entrou pelas piadas do «tudo à grande» (uma rubrica do Nilton) metendo a sua mulher à mistura e tudo, no quarto deles, deixando subentendido piadolas sexuais, etc. Esse momento foi mesmo a cereja no topo do bolo.

Se quando eu entro pelos mesmos caminhos, no meu círculo de amigos, e muitas vezes nem piada tem, muito menos piada terá num candidato a primeiro-ministro na televisão (que o faça em privado com os amigos, espero que sim, que dá saúde e faz crescer!).

Quando quero sei ser palhaço e percebi que Passos Coelho também o sabe fazer. Mas não é isso que se quer ali. O que se quer ali é que sejam terrenos, tão-só. Que não discursem eloquentemente sobre o deficit, a troika, o FMI, o TGV e por aí fora. E pronto. Não é preciso ir mais além. Não é preciso dar show. Isso é o papel do programa, não do convidado.

Não me interessa que o meu primeiro-ministro saiba ser palhaço. Interessa sim ter sentido de humor e que saiba encaixar umas piadas. Mas sobretudo, que seja terreno, um homem vulgar.

É a principal imagem que interessa passar em programas deste género.

Até no aspecto formal Passos Coelho conseguiu falhar: extraordinário. Foi o único que não se sentou na ponta do sofá. Com isso, apareceu muitas vezes no plano com os braços cortados em vez de aparecer natural e descontraidamente com o braço e a mão em cima do braço do sofá. Pormenores, eu sei, mas perguntem lá ao Luís do Sócrates se isto não conta. Ó se conta... E Eduardo Cintra Torres julgo que diria o mesmo, meu antigo professor e crítico de televisão. Mostrar as mãos em televisão, é um must. E não só em televisão.

Nota curiosa para o uso do SL Benfica nestas demonstrações de terrenidade, mas é compreensível dada a sua comum conotação como «clube do povo». Se ao Jerónimo foi normal essa demonstração (para quem já esteve inclusive na Benfica TV a ser entrevistado), já a demonstração terrena de Passos Coelho pareceu forçada. Adorei quando diz, rapidamente e num volume de voz mais baixo que «não sou sócio, mas...». Porque se ser do Benfica é ser mais popular (assim numa análise muito crua, claro) ser sócio (!) então dá aquela conotação ainda mais... firme e popularucha (daí ter dito, quase envergonhado, que não era sócio, como se isso fosse alguma vergonha...).

Foi pena pois seria um toque popularucho a dobrar! É do Benfica? Eh pá, espectáculo! E sócio também? Fogo, aquilo é que deve ser amor ao clube. Fica sempre bem, ele sabia e por isso deixou-se envergonhar, ainda que por breves segundos (estava aqui a pensar para com os meus botões e não me lembro de em tempo algum ver Sócrates numa posição destas, quase envergonhado, nem mesmo em matérias muitíssimo mais delicadas, just sayin'). E seria a triplicar, pois conseguiu aglutinar os dois maiores clubes de Lisboa dizendo que a sua mulher é do Sporting e pronto, fica mais ou menos dada uma no cravo e outra na ferradura.

Para concluir, Passos Coelho é muito melhor no papel de político do que no papel de homem vulgar.

Esperemos então por Sócrates (também gosta pouco desta exposição) hoje à noite e por Portas (mestre nestas lides!) na sexta.

Estarei cá para dizer de minha justiça.

5 para a meia-noite do Jerónimo.
5 para a meia-noite do Louçã.
5 para a meia-noite do Passos Coelho.

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